Quando são debatidos os diversos métodos de avaliação de empresas, o Fluxo de Caixa Descontado (FCD) se destaca como um dos mais indicados. O método é citado pela literatura como um dos mais utilizados em avaliação de empresas, sobretudo quando se objetiva traçar as políticas de aquisição, venda e investimentos. Isso ocorre, pois, o valor da empresa tem relação direta com as expectativas e capacidade de geração de fluxo de caixa futuros.

A avaliação de um ativo parte inicialmente de uma análise minuciosa do seu Demonstrativo de Resultados do Exercício (DRE) e das especificidades operacionais do negócio que será avaliado. É comum utilizar como ponto de partida a DRE dos últimos anos fiscais para se projetar os anos seguintes. Este seria o caminho usual em todos os valuations pelo método do Fluxo de Caixa Desconto.

Alguns setores, entretanto, possuem algumas peculiaridades que devem ser respeitadas, como por exemplo o setor da Construção Civil, que possui normas específicas para o reconhecimento de Receitas e apuração de Custos.

A contabilização dessas empresas está ligada às normativas do CPC-47 (antiga CPC-17) onde são estabelecidos os princípios para reconhecimento das receitas de contratos de fornecimento de bens e serviços de diversos setores, dentre eles a Construção Civil. A normativa estabelece o sistema de reconhecimento de receita de acordo com o Percentage of Compliance (POC), ou seja, reconhecimento conforme andamento físico da obra (ao longo do tempo) ou na entrega das chaves (em momento específico), no caso das empresas de Construção Civil.

A prática mais comum consiste em utilizar a evolução da obra considerando um percentual do custo incorrido em relação ao custo total orçado para o empreendimento, a partir do início físico da produção, ou seja, da execução da obra.

Uma vez que o faturamento contábil não possui uma relação temporal muito bem definida, no primeiro momento, com o fluxo de caixa da empresa, é recomendado que a análise dessas empresas seja mais focada no fluxo de caixa operacional do negócio, do que na DRE em si, que não trará muita informação útil ao avaliador.

Um bom exemplo são as empresas de Construção Civil listadas na B3, é observado que várias apresentam um Lucro Líquido positivo, dando a falsa impressão de que estão gerando caixa e, consequentemente, conseguindo honrar suas dívidas e pagando dividendos aos acionistas. Porém, ao se realizar uma análise mais aprofundada dos desembolsos e fontes de financiamento, através do fluxo de caixa dos empreendimentos, pode ser observada a real situação das mesmas, que em alguns casos, são inclusive, situações deficitárias no curto prazo, visto que o recebimento de certos empreendimentos, quando não financiados através de instituições financeiras, pode levar décadas para ocorrer.

Por conta da atemporalidade entre os documentos Contábeis e Fluxo de Caixa Operacional do negócio nesse setor, a construção de um modelo de avaliação também deve ser diferente.

(1) As projeções para as Receitas devem seguir os prazos de financiamento acordados entre a construtora e seus clientes diretos e, caso haja intermediação de instituições financeiras, os prazos com as próprias instituições. Além disso, o avaliador deverá sempre analisar os distratos ocorridos, que são muito comuns no setor;

(2) Para a análise dos Custos, é necessário estimar com exatidão o prazo da obra e a curva de produção, além da sazonalidade de cada empreendimento (em períodos de chuva e períodos secos, a evolução do empreendimento ocorre de maneira diferente);

(3) Tendo em vista que a melhor análise do Fluxo de Caixa dessas empresas não é pelo método indireto, estimar o NCG/CDG via Balanço Patrimonial e DRE torna-se dispensável no primeiro momento. Nesse ponto, é importante analisar os fluxos de recebimentos e de desembolsos da construção, obtendo o fluxo de caixa operacional do negócio;

(4) A perpetuidade está ligada diretamente ao modelo de negócio realizado, ou seja, empresas que possuem um fim determinado (mesmo que de longo prazo), como por exemplo SPE’s (sociedades de propósitos específicos) que construirão apenas um empreendimento para comercialização, não devem possuir valores de perpetuidade, vis-a-vis as grandes Construtoras que devem englobar em seu Valor de Mercado uma perpetuidade atrelada.

(5) Em ambos os casos citados acima, as fontes de financiamento são, geralmente, através de capital de terceiros (instituições financeiras). Portanto, analisar a capacidade de geração de caixa para honrar as dívidas nesse setor é tão importante quanto projetar as Receitas e Custos. Estas empresas, geralmente, possuem uma alavancagem financeira elevada e dependem dela para continuar financiando novos empreendimentos.

A maior dificuldade para um avaliador que queira manter o modelo tradicional do FDC ao elaborar o valuation de uma empresa neste segmento, está em recriar com exatidão o seu fluxo de caixa operacional. Neste caso, portanto, é recomendado que primeiro seja realizada a projeção do fluxo de caixa operacional de cada empreendimento separadamente para, então, projetar o seu DRE consolidado. Apesar de não trivial, esta mudança no processo de elaboração da modelagem financeiratorna a avaliação do negócio mais precisa e coesa.

 

ARTIGO ESCRITO POR HENRIQUE PORTO – SÓCIO DA FC PARTNERS

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