A busca por eficiência operacional, cross selling de produtos, carteira de clientes, novas regiões de atuação, são alguns dos motivadores estratégicos que, como descrito no artigo “Motivações Estratégicas no Processo de M&A”, aceleram as operações de Fusões e Aquisições (M&A).

O processo de M&A é composto por diversas etapas, que vão desde a Tese de Investimentos até o Signing (assinatura da documentação) e Closing (pagamento e transferência das cotas ou ações) da operação. Entretanto, para que a operação tenha maior sucesso, é aconselhável que as partes sempre avaliem o ativo que está sendo adquirido/vendido. O Laudo de Valoração (Valuation) acontece na etapa inicial do processo de M&A como sendo aquela que se define o valor justo da Empresa, em que normalmente são utilizadas diversas metodologias como o Fluxo de Caixa Descontado e a análise de Múltiplos do setor.

A construção de um Valuation pode ser subdivido em várias micro etapas, envolvendo principalmente as análises de mercado, concorrentes, demonstrações financeiras, projeções dos resultados, do fluxo de caixa e de transações passadas.

A etapa da análise dos demonstrativos financeiros deve ser comparada a uma Pré Diligência, pois existem certas semelhanças com uma Auditoria, onde é analisado o passado e presente da Empresa buscando identificar eventuais divergências entre os registros contábeis e os controles financeiros e gerenciais.

Esta etapa é extremamente importante na elaboração do Valuation, tendo em vista que os cálculos de eventuais passivos, contingências e ajustes nas demonstrações financeiras, farão com que as projeções financeiras fiquem mais fidedignas, ao trazer uma situação mais clara do Ativo. Ainda, durante a avaliação por múltiplos, os indicadores financeiros também refletirão a real situação da Empresa quando comparada com seus peers de mercado. Esses ajustes precisam ser fundamentados, pois serão ratificados na etapa de Due Diligence pelos Auditores.

As primeiras análises são realizadas ao confrontar os controles internos e as informações contábeis de todas as rubricas da DRE. As divergências mais comuns, que demandam atenção e ajustes geralmente são:

  • Receita: a análise dos relatórios gerenciais visa a identificar receitas que, porventura, não estejam nos registros contábeis. A ausência destes registros pode acarretar eventuais passivos relativo ao não recolhimento de impostos no período, o qual potencialmente reduz o valor da Empresa. A não contabilização de alguma receita também pode gerar divergência entre a geração de caixa contábil e a real de geração de caixa de uma empresa, alterando, em alguns casos de forma significativa, as margens do negócio. Ainda, importante realizar uma análise cuidadosa sobre a rubrica de Disponibilidades do BP, visto que essa divergência pode inflar o caixa de maneira fictícia.
  • Impostos Diretos: essa análise visa identificar se o Regime Tributário, e consequentemente as alíquotas, que a Empresa se qualifica estão de acordo com os valores recolhidos e apresentados na DRE. Pelo confronto com a legislação vigente, é verificado se os valores/porcentagens estão condizentes. Caso a Empresa esteja recolhendo os impostos de maneira indevida, sem qualquer respaldo jurídico para tal motivo, é necessário realizar o ajuste com as alíquotas corretas, o que também pode alterar as margens de rentabilidade.
  • CMV/CSP:  a análise do custo da mercadoria vendida visa identificar se as movimentações e preços médios do estoque estão sendo apurados de maneira correta. De forma resumida, para calcular ao CMV, deve ser feita a soma do estoque inicial (EI) com as compras do período (C), menos o inventário ou estoque final (EF), CMV = EI + C – EF. Uma das causas mais comuns da divergência é a baixa frequência de realização de inventários físicos, que por consequência, não corrigem a tempo os erros do consumo dos itens. Em certas situações, é comum notar que algumas empresas não tratam a movimentação do Estoque no Balanço Patrimonial (BP) e por consequência contabilizam toda a compra de insumos como CMV, inflando os custos. Ao analisar a movimentação do estoque, em um certo período, é possível comparar com o CMV apontado na DRE.
  • Serviços de Terceiros:  a análise da composição desta rubrica visa identificar a existência de serviços prestados por profissionais que porventura possuem vínculo empregatício (subordinação, notas fiscais sequenciadas e cronogramas de trabalho são alguns dos indícios). A identificação destes PJs faz com que a folha salarial seja ajustada, ao incluir os devidos encargos da CLT.
  • Pro-Labore: a remuneração dos sócios é relativa ao trabalho executivo desempenhado nas atividades da Empresa. Geralmente a demonstração contábil retrata uma contribuição abaixo da realidade do valor, uma vez que é comum observar que grande parte da remuneração dos sócios é paga através antecipação ou distribuição de lucros. Essa é uma estratégia comum a muitas empresas, a fim de obter vantagem tributária. Quando identificado, é necessário incluir esse valor de forma gerencial na DRE, reduzindo as margens de rentabilidade. Caso o Sócio faça retiradas acima das práticas de mercado, o ajuste é realizado considerando um salário hipotético de mercado.
  • Aluguel de Imóveis Próprios: Em uma negociação de compra e venda de empresas, muitas vezes os imóveis próprios não fazem parte da negociação. A partir da análise do imobilizado da Empresa, caso seja identificada a existência de imóveis próprios, faz-se necessário realizar o ajuste, retirando o valor do imóvel do imobilizado e calculando a despesa com o valor do aluguel, a preços de mercado, para incluir na despesa da DRE.
  • CSLL e IRPJ: Após todos os ajustes efetuados, caso o regime de tributação seja pelo lucro real, é necessário recalcular de forma gerencial o novo imposto a pagar. Caso o regime de tributação seja o lucro presumido, somente será necessário recalcular caso ocorra a adição de receitas não contabilizadas.

  

 Para todos os ajustes comentados acima, que impactam diretamente as margens e rentabilidade da Empresa, ainda é importante mencionar que a depender da análise da diligência jurídica sobre estes assuntos, caso sejam considerados passivos com alto potencial de execução, os valores podem ainda ser abatidos do valor final da Empresa como contingência.

Em muitas situações é comum que os empresários se atenham somente aos valores contábeis da Empresa, sem levar em considerações certos ajustes gerenciais que devem ser feitos de maneira a refletir a real rentabilidade da Empresa. Como alguns dos principais indicadores para avaliação via múltiplo são impactados diretamente (Receita Líquida/Sales, EBITDA, Lucro Líquido etc.), é importante que essas análises sejam consideradas previamente, antes de iniciar qualquer tratativa com potenciais compradores.

Essa etapa de análise dos demonstrativos financeiros (ou Pré Diligência) ocorre justamente para que durante uma negociação as expectativas dos sócios estejam alinhadas e não gere expectativa irreal quanto ao valor justo da Empresa.

 

ARTIGO ESCRITO POR LEO PEREIRA– ASSOCIADO DA FC PARTNERS

Acesse o nosso site: http://www.fcpartners.com.br