O século XXI se tornou palco de grandes cases de investimentos milionários e bilionários em startups. Se em outro momento os grandes investidores, como Warren Buffett, procuravam por empresas com gestão profissional, forte controle orçamentário e boas margens de lucro, nos últimos anos o cenário vem se mostrando diferente. Esse novo cenário mostra uma lógica até então inimaginável no mercado financeiro, alterando inclusive alguns padrões nas Bolsas de Valores, com inúmeros investimentos e abertura de capital (IPO – “Initial Public Offering” ou oferta pública de ações) de empresas sem geração de lucro ou caixa.
Com a grande valorização de startups, algumas com presença global, pode-se dizer que os grandes investidores se renderam a estas oportunidades e passaram a apostar em tecnologias disruptivas com crescimento exponencial, independente da rentabilidade. Um levantamento do professor da Universidade da Flórida, Jay Ritter, apontou que 81% dos 134 IPOs realizados nos Estados Unidos em 2018 foram de companhias que registraram prejuízo nos 12 meses anteriores à abertura do capital. O Lucro ou Prejuízo, última linha da Demonstração de Resultados do Exercício (DRE), é um importante indicador da saúde financeira do negócio. Entretanto, conforme destacado acima, algumas empresas avaliadas em milhões, ou até mesmo bilhões, não reportam lucro em suas demonstrações financeiras. Alguns exemplos destas empresas são as globais Uber, Spotify e a brasileira Nubank.
Devido ao sucesso dessas empresas, como as mencionadas acima, os investidores foram seduzidos pela possibilidade de se tornarem sócios de potenciais unicórnios (designação para startup que possui avaliação de preço de mercado no valor de mais de 1 bilhão de dólares) e passaram a realizar análises de rentabilidade e crescimento mais flexíveis e genéricas.
Empresas como Amazon, Netflix e Facebook, que por longos períodos apresentaram prejuízos, se consolidaram como grandes players mundiais, tornando suas operações rentáveis. Esses exemplos servem como incentivo perverso para estes investidores, que não querem correr o risco de perder a oportunidade de investir em um novo unicórnio. Muitas empresas utilizam deste marketing para atrair investimento, como por exemplo a Uber, que para seduzir investidores em seu IPO utilizou o discurso de que a empresa seria a “nova Amazon dos transportes”, segundo o New York Times.
Adicionalmente muitos especialistas defendem a tese de que startups disruptivas e altamente escaláveis precisam manter um nível elevado de investimentos no intuito de criar uma base sólida de clientes e constantemente desenvolver inovações em seu produto ou serviço.
Sendo assim, os prejuízos fazem parte do crescimento e podem ser analisados como “investimento” e não um indicador de modelo de negócios fracassado. Reconhecidamente como um dos maiores especialistas em Valuation, Aswath Damodaran escreveu à BBC News Brasil: “Elas (startups) valem tanto no primeiro momento porque as pessoas que investem nessas empresas acreditam que elas tenham potencial para gerar muito dinheiro no futuro e, mais importante, porque elas acreditam que podem vender (sua participação) para outra pessoa por um preço ainda mais alto”.
Casos bem sucedidos do passado, mercados com grande potencial de crescimento, produtos ou serviços com forte diferencial competitivo, tecnologias disruptivas e empreendedores espetaculares são alguns exemplos que podem ajudar a entender esse novo padrão. É consenso nos Fundos de Venture Capital e Private Equity que um alto percentual de seus investimentos provavelmente não trará o retorno esperado ou até mesmo irão quebrar, porém caso uma empresa cumpra seu objetivo, os demais investimentos serão compensados.
Para manter em pleno funcionamento, essas empresas que apresentam constantes prejuízos precisam de várias rodadas de investimentos, além de captações provenientes dos processos de IPOs, proporcionando a perenidade dos negócios.
Em 2019 algumas notícias relacionadas à algumas dessas startups começaram a repercutir negativamente, freando o apetite dos investidores neste perfil de empresa e novamente reforçando análises de indicadores de rentabilidade.
O surpreendente adiamento do IPO do WeWork corrobora com esta queda de confiança do mercado. A empresa de co-working viu seu valor de mercado despencar abruptamente após uma tentativa de IPO frustrada. Seu maior investidor, o Softbank, teve que assumir o controle da empresa e começou a adotar medidas focadas na rentabilidade do negócio em detrimento do crescimento acelerado.
Seguindo a mesma tendência, a Uber anunciou em fevereiro/20 que irá mudar seu posicionamento. “A era do crescimento a qualquer custo acabou”, disse Dara Khosrowshahi, CEO da companhia, na divulgação dos resultados do último trimestre da empresa. Com a mudança, a Uber também irá priorizar a rentabilidade.
Não há dúvidas no enorme potencial de empresas como Uber, WeWork, Nubank e Spotify, e nos seus modelos de negócios que revolucionaram o mercado em que atuam. Elas foram pioneiras e suas tecnologias disruptivas contribuíram na mudança de paradigma dos mercados em que estão inseridas. Isso não quer dizer, entretanto, que a antigas formas de avaliar Ativos tenham ficado obsoletas, porém ficou claro que o novo direcionamento dessas empresas remete a rentabilidade, indicando um crescimento mais sustentável, alinhado à práticas utilizadas pelos investidores mais tradicionais, com criação de valor para os Sócios e/ou Acionistas.
ARTIGO ESCRITO POR PEDRO FENATI – SÓCIO DA FC PARTNERS
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