Várias são as motivações estratégicas, tanto do comprador quanto do vendedor, que culminam em operações de Fusões e Aquisições (M&A). O comprador pode estar interessado em diversificar sua oferta a partir da aquisição de novos produtos ou serviços, encurtar o processo de entrada em uma nova região geográfica ou até mesmo ter acesso a uma carteira de clientes de um novo segmento. Já as motivações do vendedor incluem a demanda por mais recursos do que ele possui capacidade de captar para a expansão das operações, a melhora de seus indicadores financeiros ou simplesmente a diversificação do risco de concentrar quase todo o seu patrimônio em um único setor.
Outra importante motivação estratégica é a captura de sinergias, visando eficiência operacional e financeira, que pode ocorrer através da redução de custos, extinção de áreas corporativas redundantes, aumento de receita com vendas cruzadas de produtos (cross-selling) ou otimização de ativos até então subutilizados.
A 3G Capital, capitaneada pelos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Sicupira, tornou-se mundialmente conhecida como uma especialista em aquisições estratégicas motivadas pela captura de sinergias operacionais e financeiras. Desde 1989, com a aquisição da cervejaria Brahma, o trio e seus vários executivos, tem seguido o mesmo modus operandi em suas aquisições: compra de marcas de consumo extremamente conhecidas, grande disciplina com os custos e despesas, redução de funções redundantes e cultura pautada na meritocracia. Esta metodologia, simples de compreender, mas extremamente difícil de executar, traz aumento de eficiência para a companhia adquirida e, consequentemente, expansão das margens e geração de caixa para os acionistas.
Dentre as várias empresas adquiridas conforme o modus operandi descrito, as de maior destaque são as aquisições realizadas no setor de alimentos: Burguer King (2010), Tim Hortons (2014), Popeyes (2017), Heinz (2013) e Kraft Foods (2015). Com a combinação das duas últimas empresas citadas, a 3G Capital passou a controlar o 3º maior conglomerado de alimentos da América do Norte, 5º maior do mundo.
Segundo notícia do Jornal Época Negócios, em 30/04/2018, durante conferência anual do Instituto Milken, em Los Angeles, EUA, Lemann aproveitou a oportunidade para externar alguns pensamentos sobre o modelo de negócios adotado pela 3G Capital. Falando sobre as novas tecnologias disruptivas sendo desenvolvidas e, cada vez mais utilizadas pelos consumidores, Lemann se considerou um “dinossauro assustado”, acostumado a um ambiente de negócios no qual o foco na eficiência tem elevada probabilidade de geração de bons resultados.
Conhecendo-se o histórico da 3G Capital, como explicar a declaração de Jorge Paulo Lemann, na qual se compara a um “dinossauro assustado”?
A resposta passa, essencialmente, por dois aspectos: mudança no comportamento dos consumidores e a proliferação crescente de novas tecnologias.
Como ressaltado pelo próprio Lemann, os clientes hoje têm acesso a centenas de novas marcas nas prateleiras do supermercado. Além disto, muitos clientes já não vão mais aos supermercados, realizando suas compras através de apps em seus smartphones. As novas tecnologias mudaram também o mercado de trabalho, elevando a rotatividade dos funcionários das empresas, dificultando a retenção de conhecimentos das organizações.
Neste novo e mais dinâmico ambiente de negócios, as antigas motivações de M&A da 3G Capital (redução de custos e aumento de eficiência), não alcançam os mesmos resultados de outrora. O dinamismo do mundo de hoje requer um ingrediente adicional: é preciso também inovar.
A necessidade de inovação tem impacto também no mercado de M&A, onde percebe-se um interesse cada vez maior de investidores em empresas com vocação para pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). Ou seja, muitas transações possuem como motivação o aumento da capacidade de inovar em determinado segmento.
Diante deste contexto, a 3G Capital vem mudando a sua forma de fazer M&A. No setor de cervejas, por exemplo, o foco tem sido a aquisição de pequenos produtores de cervejas artesanais, que possuem, como principal ativo estratégico, sua capacidade de inovação. Um exemplo recente é a compra da cervejaria Wals, que contemplou a manutenção das receitas das cervejas artesanais produzidas pela cervejaria mineira – o que limita a implementação de medidas de redução de custos – e também a contratação dos principais sócios para a área de inovação da Bohemia (empresa controlada pela 3G Capital).
Em face ao cenário desafiador, a estratégia de crescimento da 3G Capital pouco mudou, sendo ainda baseado na aquisição de empresas. Destaca-se, no entanto, a mudança no perfil das empresas adquiridas, agora alinhado à motivação das transações: a inovação.
Apesar dos ganhos de sinergia ainda serem verificados em grande parte das fusões e aquisições, é importante que outras motivações estratégicas, tais como a capacidade de inovação, sejam objeto de análise e discussão dentro do processo de M&A, uma vez que a captura de sinergias, ainda valiosa, tem se tornado mais difícil de se concretizar em função das mudanças na dinâmica do ambiente de negócios.
Artigo escrito por Matheus Rigueira – Associado da FC Partners
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